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Por que a esquerda é tão mal humorada? - Discurso político

Discurso político Por que a esquerda é tão mal humorada?

Vale a pena reforçar a pergunta: "por que a esquerda é tão mal humorada?". Nada a ver com "por que a esquerda é tão isso?" ou "por que a esquerda é tão aquilo?". O que interessa aqui é apenas o humor. Não importa o conteúdo, mas a forma da mensagem.

A curiosidade do título veio de uma leitora. "Os liberais parecem ter mais senso de humor", dizia ela. "Eles fazem textos mais divertidos. A leitura dá mais prazer, mesmo que não concordemos. Por que a esquerda não consegue fazer o mesmo?".

É uma boa pergunta. Ignorando o humor, essa "esquerda" perde a chance de fazer sua mensagem ser mais bem aceita. Talvez ele esteja tentando. Desculpe, não está conseguindo. Por que toda essa dificuldade?

Para tentar responder, vai ser preciso usar os termos da nossa leitora: "esquerdista" e "liberal". Pode ser difícil reduzir a realidade política dessa forma. Mesmo assim, talvez valha a pena. Sim, é uma visão simplista. Mas ao menos possui a virtude de permitir continuar.

Dito isso, a esquerda mal humorada talvez seja uma impressão – mas é uma impressão forte. Os cartuns de Carlos Latuff são representativos. Ali não há piada, somente rancor. Com certeza deve haver gente bem humorada na esquerda. Mas são os rabugentos que se sobressaem.

Diante disso, a impressão de que os liberais são mais bem humorados é inescapável. Eles têm uma longa tradição de estilo mordaz e hilário, que inicia com Voltaire e prossegue com os autores do Manual do perfeito idiota latino-americano. Quer rir com política? Leia liberais.

Por outro lado, a tradição estilística da esquerda é notoriamente rabugenta. Essa tradição sem dúvida começou com Marx. Seus textos deixaram um legado inteiro de ressentimento. Eles podem ter valor para alguém, mas pode ser difícil rir deles.

Alguém poderia cair no erro de explicar dizendo que esquerdistas têm capacidade limitada de entender e de produzir ironias. O discurso deles teria mais apelo junto a pessoas ressentidas, incapazes de aceitar a complexidade do real.

Esse argumento pode esbarrar em muitos problemas. Os liberais mais conservadores agem de forma semelhante. E a explicação talvez sirva apenas para um esquerdista radical demais. Faz mais sentido buscar uma explicação melhor. Sim, ela existe.

Essa explicação melhor surge ao contrastar a forma como o liberal e o esquerdista se retratam em suas peças de humor. Esse contraste informa não apenas como disputam espaço no debate político. Ele revela que tipo de atitude eles possuem sobre a vida.

Para os esquerdistas, o liberal é o inimigo. Suas caricaturas retratam o liberal como uma personificação de toda desgraça. O liberal é "fascista", elitista, arrogante, esnobe. É preciso "destruí-lo" a todo custo, sem concessão e sem fazer prisioneiro.

Enquanto isso, o liberal entende o esquerdista como um ingênuo ou como um patife, figuras fáceis para caricatura. No geral, o liberal aponta as contradições do esquerdista. Isso permite desenvolver um estilo mais contundente e divertido.

Por fim, é possível que o liberal tenha mais autocrítica. Em muitos casos, o liberal aceita que nada deva ser levado totalmente a sério. Não vale a pena morrer por uma ideia: pode ser que esteja errada. Isso abre espaço para humor.

Por outro lado, o esquerdista está convicto de sua "cruzada" contra o "demônio" liberal. Isso somente é possível com fervor e sem autocrítica, tornando difícil qualquer tipo de diversão. Rir é uma fraqueza.

O esquerdista não consegue rir do liberal, que considera odioso e terrível. Mas o liberal consegue rir do esquerdista, que considera patético. Esse contraste provavelmente explica por que a esquerda é tão mal humorada.

Ironicamente, o humor do liberal provavelmente torna sua atuação política mais folgada. O liberal encontra conforto no riso. Enquanto isso, para o esquerdista, nada existe além da política. Rir pode ser um ponto forte. Mas é também um ponto fraco.


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