Warning: mysql_num_rows(): supplied argument is not a valid MySQL result resource in /home/capixabao/public_html/_v5_meta.php on line 1480
Salve o Sorvete! - (Montanha, ES)

Montanha

Salve o Sorvete! - Montanha

Montanha Salve o Sorvete!


POR MARCO MERGUIZZO

Associado invariavelmente à estação mais quente do ano, o sorvete é uma tentação gelada consagrada no mundo todo e que a cada temporada é deliciosamente reinventada com novos ingredientes, cores e sabores. Embora sua origem cause polêmica, ele é unanimidade na hora em que a temperatura sobe. Alimento popular e democrático que aplaca o calor, refresca e seduz o paladar - ele pode ser saboreado puro ou incrementado com calda, marshmelow e coberturas variadas. Ou ainda integrar receitas de bolos, doces e sobremesas. Com os similares light e diet, hoje cada vez melhores, até gordinhos e diabéticos não se furtam mais dessas gostosuras. Seja como for, ninguém resiste a uma bola - ou várias delas - dessas delícias refrescantes.

Uma pasta de leite e arroz colocada na neve para solidificar. Esta talvez tenha sido a receita do primeiro sorvete criado na China há cerca de 3.000 anos – bem antes, portanto, do surgimento da geladeira e do freezer, modernidades inventadas apenas no século passado. Há quem conteste, porém, se de fato os chineses teriam sido os pioneiros da casquinha e do palito. Para Jeffrey Steingarten, o espirituoso crítico gastronômico da Vogue americana e autor do divertidíssimo livro O Homem que Comeu de Tudo, essa teoria não faz o menor sentido, já que nem Alexandre o Grande ou tampouco Marco Polo em suas andanças pelo Oriente dedicaram uma linha sequer em seus relatos sobre “o fascínio chinês pelo ato de recolher, armazenar e usar a neve e o gelo para preparar alimentos refrescantes.”

TATARAVÔ DO SORVETE

Marco Polo: nenhuma linha sobre o suposto avô do sorveteSteingarten acredita que, em seus primórdios, o tataravô do tataravô de todos os sorvetes tenha sido feito a partir de uma mistura de água congelada extraída das calotas montanhosas do Velho Mundo, mais suco de frutas frescas, açúcar, ou, quem sabe, um xarope ligeiramente aromatizado e doce. Tudo leva a crer que os invasores mouros tenham sido os primeiros a elaborar a alquimia, a partir do século 13. Nessa época, além de introduzirem o açúcar no continente europeu, eles já dominavam a técnica de fazer xaropes – denominada de charbat –, adoçando os sucos de frutas. Um tratado antológico de cozinha, escrito no século 11, por Wusla Hila al Habib, dedica um capítulo inteiro ao sorvete, respaldando a tese de Steingarten. A origem do termo, segundo outra pesquisadora, a portuguesa Isabel Mendes Braga, no livro Gelados - História de uma Doce e Fresca Tentação, vem da palavra árabe charâb, derivada de charbat, que os turcos por sua vez mudaram para chorbêt – daí o seu nome de batismo.

Embora usassem uma técnica primitiva, já que o gelo não se integrava à mistura, os muçulmanos foram os que primeiro ensinaram os sicilianos a misturar líquidos doces à neve do vulcão Etna e a devorar tal mistura. Foi desse modo que nasceu a granita – uma espécie de raspadinha que é provavelmente o ancestral mais próximo do sorvete. Antes disso, outros colonizadores daquela região do sul da Bota italiana, caso de gregos e romanos, tinham o hábito de recolher a neve das encostas do famoso maciço, guardá-la em poços profundos, para depois associá-la a frutas e a outros ingredientes a fim de se deliciarem e “limparem” o paladar durante as refeições. Sim, como hoje o fazem os franceses com seus sorbets, sabe-se que os antigos imperadores de Roma, entre eles, Nero, fã confesso da preparação e desse ritual gastronômico, devoravam bolotas geladas entre um prato e outro em seus célebres banquetes à mesa.

CHUPANDO GELO

Outros ainda, como sarracenos e espanhóis, armazenavam a neve em cavernas. No verão, recuperavam aquele “tesouro em flocos de neve" para preparar bebidas refrescantes e sobremesas geladas embebidas com essências de frutas adoçadas com mel e vinho. Steingarten, entretanto, também duvida dessa versão sobre a paternidade do sorvete. “Os romanos podem ter bebido vinho gelado e os árabes ter gelado seus charbats com montículos de neve, mas nenhum desses povos poderia ter feito sorvete de verdade, porque eles não conheciam o segredo científico do congelamento artificial”, contesta. Segundo o escritor-gourmet, a técnica mais antiga desse tipo de congelamento, também conhecida como “efeito endotérmico”, foi encontrada em um livro indiano do século 4, cujo título era Pancatantra. Nele, há um verso esclarecedor no qual se informa que a água só pode ficar realmente fria quando ela contém sal e nitrato de potássio (salitre).

Tal segredo químico só seria resgatado e aprimorado doze séculos depois pelo arquiteto florentino Bernardo Buontalenti. Entretanto, foi uma conterrânea sua, Catarina de Médicis, sobrinha do papa Clemente VII, quem levou a novidade para a França, quando se casou, em 1533, com o futuro rei Henrique II, em bodas arranjadas pelo tio pontífice. À época, o sorvete continuava a ser preparado com água apenas - sem leite ou ovos —, de acordo com a Grande Enciclopedia Illustrata della Gastronomia. O uso desses dois ingredientes e de aromatizantes só seria testado, aprovado e se consagrado um século depois, graças ao confeiteiro do rei Carlos I, da Inglaterra, cuja esposa era ninguém menos do que a neta de Catarina. Guardada a sete chaves pelos ingleses, o segredo só seria redescoberto pelo italiano Francesco Procopio, que, em 1686, abriu em Paris o tradicional café Procope, então um ponto-de-encontro de iluministas, mas em funcionamento até hoje. Assim como os ideais libertários de Descartes, Rousseau e Diderot, a novidade gelada, considerada revolucionária à época, ganharia novos endereços. Porém, seu consumo seria restrito às elites europeias.

Trazido ao Novo Mundo pelos colonizadores ingleses, o sorvete agradou em cheio aos americanos, hoje os principais produtores e consumidores do planeta. Mais do que sorvê-lo simplesmente, porém, eles foram fundamentais no processo de industrialização e massificação do produto. Em 1851, um poderoso comerciante de leite de Baltimore, chamado Jacob Fussell, teve a ideia de converter o sorvete encalhado em ice cream (literalmente, gelo em creme) e produzi-lo em escala, fundando a primeira fábrica de sorvetes do mundo. Não é preciso dizer que a novidade caiu rapidamente no gosto popular. O trio gelado inventado no fim do século 19 no país de Tio Sam – o Ice Cream Soda, o Sundae e o Banana Split – acabaria por elevar o ice cream a um dos maiores ícones da cultura americana, ao lado de outra invenção - a Coca-cola - também criada quase na mesma época, em 1886. Outras contribuições valiosas dos americanos na história do sorvete foi a invenção, entre 1870 e 1900, da geladeira (a refrigeração mecânica permitiu a produção de gelo independente do processo natural), além da criação, quase casual, da casquinha de sorvete, que ocorreu durante a Feira Mundial de Saint Louis, em 1904. Um sorveteiro, ao ver terminar seu estoque de pratos, serviu suas disputadas bolas de sorvete nos waffles emprestados de um stand vizinho, feitos por um certo sírio de nome Hamwi (Em tempo: a autoria do picolé, porém, faça-se justiça, cabe aos italianos).

DE NAVIO

Os bons e tépidos ventos da primavera carioca de 1834 trouxeram ao Brasil pela primeira vez o gosto do sorvete. Para ser historicamente preciso, o navio americano Madagascar foi quem carregou em seus porões uma montanha de 167 toneladas de gelo em blocos. A carga preciosa, extraída das águas congeladas do rio Potomac e dos lagos de Boston, serviram de matéria-prima para os primeiros “gelados” - assim chamados - feitos aqui. Dois comerciantes compraram o carregamento e passaram a vender sorvetes de frutas. À época, não havia como conservá-los, por isso tinham que ser consumidos logo após seu preparo, para não derreterem. As sorveterias anunciavam a hora certa de tomá-los. De acordo com o historiador Carlos Alberto Ditadi, do Arquivo Nacional do Rio de Janeiro, enormes filas eram formadas na porta da Da Águia, a primeira confeitaria a oferecer o produto, que ficava na rua do Ouvidor, no centro da cidade. A novidade, porém, era considerada coisa de gente rica. Habitué ilustre, o imperador Pedro II (1825-1898) era apreciador do sorvete de pitanga da casa.

Do ponto de vista sociológico, o sorvete também ganhou à época uma conotação de transgressão por ser considerado um precursor do movimento de liberação feminina. O sociólogo e escritor Gilberto Freyre (1900-1987) relata isso em sua obra Açúcar. Para saborear um gelado, a mulher praticava um de seus primeiros atos de rebeldia contra a estrutura social vigente, ao invadir bares e confeitarias, lugares até então freqüentados quase que exclusivamente por homens. Depois do Rio, a novidade aterrissaria na capital paulista três décadas depois. O primeiro registro é o de um anúncio do jornal A Província de S. Paulo, de 4 de janeiro de 1878: "Sorvetes - todos os dias às 15 horas, na Rua Direita, nº 14." O geladinho não tardaria a chegar às demais regiões brasileiras. Uma vez em todo o país, pode-se imaginar as transformações pelas quais ele passou, incorporando texturas, cores e sabores de frutas regionais. Uma variedade incrível que desafia a imaginação e seduz o paladar a cada nova temporada de verão.

AMOR À PRIMEIRA LAMBIDA

Há basicamente três tipos de sorvete e cada um deles traduz em boa medida o estilo das três mais importantes escolas mundiais na arte de prepará-lo. Elaborado com polpas de frutas frescas ou sucos naturais, o sorbet, de sotaque francês, é um produto mais leve e refrescante. Servido entre os pratos que compõem uma refeição para limpar e preparar o paladar, ele também é indicado na preparação de bebidas e coquetéis (clique em nosso canal de receitas e faça em casa o sorbets Maiorca e de abacaxi). Já os sorvetes cremosos, que seguem a linha da sorveteria americana ou mesmo italiana, são feitos a partir de creme de leite e, portanto, mais gordurosos. Porém, são os preferidos de nove entre dez consumidores. Da gelateria peninsular também provém a granita siciliana. Não tão conhecida no Brasil mas muito consumida a qualquer hora do dia nos cafés de toda a Bota, é uma espécie de raspadinha sofisticada.

CLÁSSICÕES DA TAÇA

Banana Split

Banana splits down the middle. - ou, em bom português, "partir a banana ao meio". Graças a este insight de um sorveteiro americano anônimo que incorporou à sua receita três bolas de sorvete (creme, morango e chocolate), mais cobertura de chantily, castanhas picadas e uma cereja por cima – a fórmula do Banana Split, criada na década de 1890, se tornou um hit planetário.

Sundae

Como o Banana Split, o Ice Cream Soda e a coca-cola – o Sundae, ou Colegial, virou ícone do american way of life, no final do século 19. Seu nome é uma corruptela de sunday (domingo, em inglês), consagrando o formato grande e bojudo de sua taça. A receita pode variar. No geral, leva de duas a três bolas de sorvete de diferentes sabores, mais xarope de morango, marshmallow, chantilly e confeitos coloridos.

Chocolamour

Invenção criada nos anos 50, fez a fama do restaurante árabe Bambi em São Paulo. Sua fórmula original leva sorvete e calda quente de chocolate, chantily e farofa doce, cuja receita é guardada a sete chaves pelos donos.

Foto: Divulgãção internet


Tags:



Publicidade