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O fenômeno do Mito: o povo manda sua mensagem - EDITORIAL

EDITORIAL O fenômeno do Mito: o povo manda sua mensagem

Discutir política brasileira pode ser desafiador. Diante de tantas paixões e de tantas trocas acusatórias, é improvável que alguém consiga analisar o assunto com a racionalidade que ele merece. Mas fazer isso ainda é possível. Para frustração de alguns intelectuais, o voto do brasileiro insiste em ser pragmático, isolado de ideologias. É esse pragmatismo que explica de forma racional a popularidade do presidenciável Jair Bolsonaro, um fenômeno que merece ser discutido, porque permite entender os principais anseios políticos no país.

A ascensão política de Bolsonaro é no mínimo invejável. Talvez seja até mesmo improvável: ela surge a contrapelo de suas pesadas limitações. Bolsonaro tem poucos aliados, não tem propostas e não hesita em desafiar convenções. Mesmo assim, segue ganhando preferência do eleitorado em pesquisas como as do Datafolha e da XP. Mas essas pesquisas não são os melhores indicadores de sua popularidade. O que fala mais alto é a reação popular. Bolsonaro é o único presidenciável, por exemplo, que tem sido espontaneamente recepcionado em aeroportos. Agindo dessa forma, o povo manda sua mensagem. Ela precisa ser lida por todos os brasileiros, especialmente pelos antagonistas do "mito".

Explicações como "fascismo", "racismo", "homofobia" e "ignorância" são fracas demais para explicar esse sucesso. Se há eleitores de Bolsonaro que pensam ou são dessa forma, sem dúvida eles formam uma minoria irrisória. O que certamente explica o sucesso de Bolsonaro é a forma como ele preenche o vácuo deixado pelas outras propostas políticas. Sim, ele ganha mais pela omissão alheia do que pela sua atuação. Mas isso não diminui em nada o mérito: a política também é um mercado, e as oportunidades do mercado surgem quando a demanda não está sendo satisfeita.

Para Bolsonaro, é muito fácil superar o discurso progressista. Vencido, desarticulado, o único argumento que restou ao progressismo é o de que votar na "direita" significa ser "fascista". Pode ser fácil concluir que, em termos pragmáticos, o brasileiro médio não se importa em ser rotulado dessa forma. Para ele, a prioridade certamente é reverter a situação presente de corrupção, de inseguranca e de ruína econômica, derivadas de quase duas décadas de hegemonia progressista. Para isso, votar na mesma proposta não parece uma escolha racional. Por lógica, faz mais sentido ao eleitor votar em alguém que propõe ser a antítese desse discurso.

Além disso, é igualmente fácil para Bolsonaro superar os liberais democratas. O argumento deles é ameno, comedido, ponderado. Não demonstra a energia que parece necessária diante dos problemas atuais do Brasil. Para entender isso, basta pensar em Alckmin: sereno, racional, sem carisma, incapaz de despertar entusiasmo. Enquanto isso, Bolsonaro demonstra energia e disposição. É um ex-militar, está em boa forma física. Fala de maneira extremista. Uma teatralidade importante, considerando a importância da simbologia na política.

A única chance de vitória sobre Bolsonaro parece ser de Lula. Em termos pragmáticos, o eleitor brasileiro talvez imagine que votar no ex-presidente seria uma forma de recuperar a situação favorável do período lulista. Diante disso, vale a pena ponderar que essa recuperação seria improvável. A conjuntura internacional favoreceu Lula sobremaneira na ocasião, e tudo indica que aquela bonança não irá se repetir. Mas o que realmente importa no presente contexto é que Lula com certeza será inelegível. Portanto, o ex-militar segue na frente (aliás, por que ainda realizam pesquisas incluindo Lula como candidato?).

Mesmo com tropeços, mesmo com engasgos, Bolsonaro diz aquilo que o brasileiro quer ouvir: segurança, rigor, ordem. Além disso, Bolsonaro representa tudo que o brasileiro deseja: disposição e energia para domar problemas que parecem exigir muito empenho. Tudo isso não significa que Bolsonaro seja um messias salvador. Além disso, não significa que a escolha popular é de fato inteligente. Bolsonaro é um político, e políticos são retóricos profissionais – no pior sentido do termo. Mas é inevitável concluir: ignorar a ascensão de Bolsonaro é ignorar os anseios, aspirações e desejos do povo brasileiro, que responde de forma radical diante de uma crise que parece exigir uma reação radical.

- A redação.


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