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Política brasileira: Era dos Extremos? - Editorial

Editorial Política brasileira: Era dos Extremos?

"Atenção lado A, atenção lado B". Os bailes funk cariocas, quem diria, criaram a metáfora ideal para o presente contexto da política brasileira. Surge um Lado A, escorado no progressismo; e um Lado B, ancorado no conservadorismo. O discurso conciliatório parece causar impaciência. Fique no centro e seja detestado por todos. Fique fora do espectro, como os liberais democratas, e seja marginalizado. O radicalismo soa inescapável. Nada que lembre o clima amistoso da Constituinte de 1988. Para usar a expressão daquele historiador, parecemos viver nossa "Era dos Extremos". Seria de fato isso? E como viemos parar aqui?

Acompanhar a política internacional faz concluir que o Brasil segue uma tendência mais ampla de radicalismo. Essa tendência é ilustrada de forma convincente pela ascensão política de Donald Trump e de Vladmir Putin. Desde a crise de 2008, o mundo parece convencido de que problemas severos exigem atitudes radicais – e palavreado feroz, naturalmente. Impossível não fazer um paralelo com a pré-eleição brasileira em 2018.

De uma forma ou de outra, as vertentes políticas no Brasil tentam se beneficiar dessa radicalização. Alguns evocam a ditadura com nostalgia. Outros insistem no mito da "revolución". E há os que ensaiam explosões retóricas de radicalismo, ao extremo da comicidade. O vencedor por enquanto parece ser o discurso linha dura. É o que sugerem pesquisas como as da XP e da Datafolha. Dizem até mesmo que há um "Trump brasileiro". Apesar disso, o caso brasileiro reserva particularidades que merecem ser avaliadas por si sós.

Nossa recente experiência democrática estimula o radicalismo. Foram anos de uma hegemonia progressista praticamente unânime, favorecida por uma economia mundial ascendente. A característica mais marcante dessa hegemonia sem dúvida foi o seu discurso. Visceral, revanchista, era todo baseado em fontes de risco extremistas. O exemplo mais óbvio dessas fontes era o populismo, semelhante ao de governos vizinhos na América Latina. Não surpreende que tenha gerado uma reação conservadora intensa e proporcional.

Outro estímulo à radicalização foi o inevitável desgaste dessa hegemonia. Sua tentativa mais desesperada de sobrevivência foi o apelo ao radicalismo. É o que denota a sanha politicamente correta, sugerida pela militância artística e digital. Atiçados por essa provocação, os críticos avançaram. O declínio progressista foi uma janela de oportunidade para esse avanço. Ousados, eles passaram a questionar até mesmo dogmas sociais democratas. Foi o caso das cotas e de todas as compensações sociais, jocosamente rotuladas como "vitimismo".

Para aprofundar o cenário, há situações que atiçam ao mesmo tempo o Lado A e o Lado B. Ambos se ressentem da situação do país. A economia está em frangalhos. A capacidade governamental foi depredada. O governo não consegue mais realizar a (irrealizável) promessa programática da Constituição de 1988. É claro que A e B não hesitam em trocar acusações. Para o Lado B, a culpa é do Lado A. Segundo o Lado A, a culpa é do Lado B. Como resultado, o radicalismo persiste e aumenta.

Seriam o Lado A e o Lado B incompatíveis? A resposta talvez seja negativa. Apesar das alfinetadas, ambos sem dúvida possuem convicção comum em várias ficções sociais democratas. É o caso de "setores estratégicos", "proteção ao mercado doméstico", "direitos programáticos". Talvez concordem até mesmo em teorias conspiratórias: "imperialismo", "capitalismo", "deterioração dos meios de troca", "cobiça sobre riquezas nacionais". Nos casos em que não concordem, jamais ousariam as abandonar. Seria risco político demais. No fundo, Lado A e Lado B são mais do mesmo. Os extremos dessa era são mais rasos e superficiais do que insinuam.

Resta saber aonde essa divergência irá nos levar. A julgar pelas coincidências entre os lados A e B, estamos sem dúvida girando em carrossel, indo ao mesmo lugar de sempre. Esperemos um governo com tendência expansiva, baseado em dualidades fictícias como "estado versus mercado", "capital nacional versus capital estrangeiro". O que está em disputa não são mudanças. A prioridade parece ser o monopólio da narrativa; de escrever o presente como uma "revolución" ou como um "contragolpe comunista". Usando os termos de Roberto Campos, não é um confronto visceral entre liberais e dirigistas. É apenas o verniz da direita versus esquerda, mais semelhante a uma gincana do que a um campeonato.

A verdadeira mudança viria de uma proposta liberal, baseada em redução do estado, privatizações, livre concorrência ênfase sobre direitos individuais. Ainda não será dessa vez. Ela gera riscos políticos demais em um país de tradição ibérica, cativo de um governo babá. Prometer isso é perder voto. A verdadeira mudança, gostemos ou não, ainda terá de esperar.

- A redação.


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