Espírito Santo

“Professores da rede privada merecem representação melhor - Professor Rossoni

Professor Rossoni “Professores da rede privada merecem representação melhor

Giovani Rossoni, o professor Rossoni, é ativo no ensino há mais de 20 anos. Com experiência no ramo, ele é candidato pela Chapa 2 à direção do Sinpro, o sindicato dos professores da rede privada. Em entrevista ao Capixabão, Rossoni compartilha suas ideias sobre as mudanças na grade curricular do ensino médio, a relação entre aluno e professor e o projeto Escola Sem Partido. Sobre as eleições sindicais, critica as limitações da atual gestão, denuncia as dificuldades de lançar uma chapa alternativa, comenta as principais queixas da categoria e explica as propostas da Chapa 2.

Muito se fala da educação pública. Qual a importância da educação privada no ensino brasileiro?

A educação privada supre a carência deixada pela educação pública, que não funciona como deveria. O ideal é que a educação pública fosse prioridade. Mas isso não acontece na prática, por falta de políticas e de verbas públicas. Dessa forma, a educação privada ganha cada vez mais espaço na sociedade. A educação pública estadual sofre muitos problemas: baixo investimento, baixa remuneração dos professores, carga exaustiva de trabalho, infraestrutura limitada. O setor privado supre essa lacuna, ocupa esse espaço.

A grade curricular do ensino médio está passando por uma reforma ampla. Qual a opinião do senhor sobre essa reforma no ensino médio?

Essa reforma caminha em uma direção conservadora demais. Disciplinas que trabalham formação humana e senso crítico estão sendo parcialmente extintas. É o caso da filosofia, da sociologia, das artes. Essa reforma limita as possibilidades de a educação formar bons cidadãos, bons eleitores, pessoas críticas. Com certeza o debate vai ser empobrecido. Na minha opinião, e na da maioria dos professores, a reforma significa um retrocesso na formação das humanidades. De modo geral, o mesmo está acontecendo nas escolas privadas, que se adequam ao currículo do estado.

Como tem sido a relação entre professor e aluno no ensino privado?

Como no ensino público, a situação é complexa. De um modo geral, não tem sido fácil. Em qualquer escola, de uns anos para cá, o professor tem perdido autonomia e autoridade. Isso é consequência da forma como a sociedade tem perdido valores essenciais na relação interpessoal. É o caso do respeito, da hierarquia. Uma situação cultural no Brasil que a gente vive. A relação que eu tive com meus professores era um pouco autoritária, mas tinha respeito. Isso tem se perdido um pouco. O professor não tem autonomia, até porque não é respaldado pela legislação, que prioriza o aluno. O professor acaba dessa forma engessado.

Qual a sua opinião sobre a polêmica do combate à doutrinação nas escolas e sobre o projeto Escola Sem Partido?


Sou contra o Escola Sem Partido. Acredito que a sala de aula é o único espaço democrático para estabelecer diálogo entre professor e aluno. É um engano achar que o aluno não tem vontade própria. O aluno tem ideias próprias, sim. Essa geração de agora tem acesso a muitas fontes informações. Ele não toma a fala do professor como verdade absoluta. E como a maioria dos alunos não vê o professor como única fonte de verdade – o que é bom, por sinal –, ele estabelece um diálogo com o mestre. Não é unilateral. É claro que existem excessos, mas isso não é comum. Estabelecer esse diálogo é parte da função profissional do professor. Ele tem formação acadêmica sobre determinados assuntos da sociologia, das artes, da filosofia. São profissionais autorizados que capacitam a falar daquele assunto. E esses assuntos exigem diálogo.

O professor não impõe seu ponto de vista. Pode haver casos isolados, seja de pensamento progressista ou conservador. É o extremo que deve ser combatido, não o diálogo. A forma como está acontecendo esse combate está errada. Estão calando o professor, tirando disciplinas que geram debate. Esquecem que o debate é democrático, o aluno pode falar. Os alunos conseguem fazer isso. Eles são mais informados e politizados do que pensamos. É claro, dada a idade e a baixa carga de leitura, eles sabem menos. Mas se matam esse diálogo, para que serve a sala de aula? É preciso dialogar.

O Estado não pode matar esse diálogo. Se não há diálogo, não há produção de conhecimento. Escola Sem Partido significa matar as ciências humanas. A sala de aula é o local adequado para acontecer esse diálogo necessário a essas ciências. Jornais, por exemplo, oferecem somente um lado. Sala de aula é democrático. O professor explica as perspectivas possíveis. E o aluno pode debater, ele tem esse direito.

O senhor está engajado nas eleições para o Sinpro, o sindicato dos professores do ensino privado. Quais são as críticas do senhor à atual gestão?

Tenho várias críticas, todas colhidas por meio da convivência com professores. A maior parte dos professores está insatisfeita com a atual gestão. O que mais questionam é a subserviência do Sinpro ao Sinepe, o sindicato dos proprietários dos donos de escolas. Isso gera muitas perdas trabalhistas. No ano passado, com inflação de 7,9%, tivemos reajuste de apenas 4,6%. Nem sequer para dissídio nosso sindicato levou a discussão. Há também o problema da carga horária. O trabalho do professor é exaustivo, ele trabalha mais em casa do que na sala de aula. O Sindicato não fala sobre isso. Ele não levanta a voz, não legisla em favor do professor nesse sentido. É claro, não consideramos a escola como inimiga. Para o professor estar bem, a escola tem de estar bem. Mas alguns fatos precisam de amparo legal.

O panfleto da Chapa 2 menciona aperfeiçoamento da transparência. Que aperfeiçoamento precisa ser feito?


O aperfeiçoamento mais urgente é nas próprias eleições do Sinpro: a Chapa 2 está sendo perseguida com ameaças de demissão. Na eleição passada, nove professores da nossa chapa foram demitidos. Reintegramos um deles três anos e meio depois, com direito de receber retroativo. Isso demonstra que a Justiça entendeu isso como perseguição.

Nessas eleições, os problemas continuam. Um professor da nossa chapa foi coagido a sair dela. Como se recusou, foi demitido. Ele está recorrendo, há processo na Justiça para sua reintegração. Também perdemos duas professoras na chapa, que suspeitamos terem sido coagidas. Sorte que tínhamos reserva, ou não teríamos condições de concorrer. Temos certeza que muitos professores não compõem nossa chapa por medo de represália.

Ainda há muitos outros problemas. As decisões do Sinpro sofrem de obscuridade. Não há debate com a categoria, não há assembleia. Quando convocam uma assembleia, marcam em horário de aula. Queremos estabelecer no calendário letivo um dia sem aula, para assembleia. Temos também de aperfeiçoar a transparência dos gastos do Sinpro. Propomos criar um portal de transparência, onde vai ser possível verificar todos os ganhos e gastos do sindicato. Queremos também aperfeiçoar o corte de gastos com um cartão corporativo para o presidente.

O panfleto da Chapa 2 menciona promessas não cumpridas pela atual gestão. Que promessas seriam essas?


Uma parte muito grave disso se relaciona às demandas da categoria. No ano passado, o Sinpro prometeu levar nossas propostas ao debate com a classe patronal. Eram propostas representativas, elaboradas por cerca de 40 pessoas. Infelizmente elas foram ignoradas. Tudo foi perdido em uma simulação de democracia. A atual gestão do Sinpro afirmou que o reajuste de acordo com inflação geraria risco de perdas, como previdência privada e tíquetes. A Assembleia insistiu que essas conquistas são pétreas, exceto a gratuidade da matrícula dos filhos dos professores. Diante da nossa insistência, eles prometeram levar as demandas. No lugar, surgiram com um acordo que contrariou a base. Sempre que a atual gestão negocia, há perdas para professor. Queremos reajuste de acordo com inflação. A cada ano, perdemos 3%, 2%. É perda real de salário.



Quais são as propostas da sua chapa?

Antes das propostas, acho importante declarar aqui nossa principal promessa: mesmo eleitos, vamos continuar dando aula. Vamos continuar em contato com a realidade do professor. Uma das maiores críticas da categoria ao Sinpro é a forma como os vencedores das eleições se afastam da sala de aula. A Chapa 2 não vai fazer isso. Somente em alguns casos extremos, como o do presidente. Fora isso, temos o compromisso de continuar em sala de aula. É simples, basta nossa vontade.

Sobre nossas propostas, queremos aperfeiçoar a gestão do Sinpro, os benefícios para os professores e nossa capacidade de negociação. Propomos criar uma ouvidoria para enviar reclamações e manter as reclamações em sigilo. Hoje, se um professor fizer uma denúncia, imediatamente o Sinpro delata o profissional à escola. Isso é muito sério. Outra proposta importante depende de negociação: regularizar a gratuidade da matrícula dos filhos dos professores na escola onde trabalham. Atualmente, isso não é firmado por lei. O Sinepe pode tirar a hora que quiser. Eles usam isso como moeda de troca. Queremos regularizar para garantir esse direito.

Temos outras propostas. Queremos também o Simpromulher, para cuidar de assuntos específicos das professoras, que são maioria. É o caso de assédio moral na sala de aula e nas escolas. Vamos lutar também por um plano de saúde para a categoria. Pode ser um plano específico ou por convênio, custeado pelo professor, pela escola e pelo sindicato. Propomos também lutar por uma cooperativa de crédito. Criaríamos um "banco virtual" ao qual o professor associado pagaria uma percentagem como fundo, que seria disponibilizado ao professor por uma taxa menor. Também planejamos dar atenção ao ensino superior. Queremos dar visibilidade para a produção de artigos e de trabalhos por meio de publicação em jornais, em sites, em impressos do Sinpro.

Temos certeza de que nossas propostas são muito boas: fomos até mesmo plagiados. Pegaram nosso folder e copiaram como se fosse ideia deles. É o caso da ouvidoria, da questão das mulheres. Até brinquei: nossas ideias são tão boas, que a chapa adversária simplesmente copiou!

Estamos em ano eleitoral. Quais as expectativas para a educação brasileira no próximo governo?


Como professor, espero que o novo presidente crie um programa que seja construído de forma democrática com as bases: universidades, escolas, etc. Normalmente esses programas são formados por decisões técnicas, políticas, de gabinete. Não há debate, que seria importante para estabelecer projetos de lei. Que a comunidade educacional seja mais ouvida. Que o estado reflita, por meio da lei, as vontades e as aspirações de quem é profissional do ensino. Que não sejam apenas decisões políticas e técnicas. Que incluam a formação do ser humano. Do jeito que educação está perdendo autonomia, estamos nos tornando tecnicistas demais, voltados à mera formação de operários. A educação não visa formar apenas trabalhadores. Isso é importante, mas não é apenas isso. Que o novo presidente veja o assunto com mais carinho: a educação é o único meio de fazer o país crescer.


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