Qualquer vivência no setor de saúde brasileiro revela sua falta de profissionais. Consultórios particulares estão com agenda lotada. Unidades de saúde pública não conseguem satisfazer tanta demanda. A situação é preocupante. Com a recente portaria do Ministério de Educação e Cultura (MEC), o governo pode em breve agravar esse problema.
Cedendo ao pedido de associações profissionais, o MEC baixa portaria que proíbe por cinco anos a criação de novos cursos de Medicina no país. De acordo com essas associações, a medida serviria para impedir o surgimento de cursos de má qualidade. Além disso, o Brasil possuiria um número suficiente de médicos. Não é preciso esforço para suspeitar que esses argumentos são distorcidos.
A regulação de mercados profissionais gera efeitos perversos. Seu principal resultado não é o bem estar do profissional ou do cliente. Antes, é o de danificar esse bem estar. Como em uma guilda medieval, a estratégia dessas regulações inclui restringir o acesso à profissão, controlar os preços, exigir contribuições compulsórias, punir a desobediência. Entre outros danos, isso obstrui o mercado, diminui a oferta de serviços e dificulta a interação entre o profissional e o cliente.
Muitos poderiam listar argumentos a favor dessa atitude de guilda. Pois mesmo que houvesse vantagens, elas jamais compensariam os prejuízos. Essa atitude reprovável impede a sociedade de aproveitar as benesses da livre concorrência, como preços baixos e serviços melhores. Além disso, infernizam o profissional com tributos, regulações, impedimentos, fiscalização. Por tudo, isso, esses argumentos típicos de guildas merecem ser desbaratados. É o que devemos fazer aqui.
O primeiro argumento do MEC é uma falácia: não se pode prever de antemão se um futuro curso de Medicina será aprovável ou reprovável. A única maneira de saber isso é permitir que ele opere e monitorar seu funcionamento. Manter a qualidade do ensino demanda permitir a abertura de novos cursos e fechar aqueles que não atendam aos padrões exigidos. Muitas vezes o próprio mercado fará isso com mais competência: se o curso for ruim, as pessoas não irão o procurar ou o recomendar.
O segundo argumento do MEC também é uma falácia: o Brasil precisa de muito mais médicos. Em 2016, uma pesquisa do Ipea entre usuários do SUS revelou que 52% deles enfrentam falta de médicos. Além disso, 15% dos municípios brasileiros não possuem nem sequer um profissional de saúde. Em outros 1,9 mil municípios, 3 mil pacientes tentam ser atendidos por um único médico. O programa Mais Médicos foi uma tentativa de remediar essa situação calamitosa.
Há motivos para suspeitar que o verdadeiro objetivo do MEC é ilegítimo e típico de uma guilda: conceder privilégios de mercado a grupos organizados. Esses privilégios incluem baixa concorrência, preços altos, despreocupação com qualidade de serviço. A melhor estratégia para isso ainda é impedir que mais profissionais adentrem o mercado. Para isso, nada melhor do que sufocar a fonte, impedindo o surgimento de novos cursos.
Se o objetivo do MEC for realmente autêntico, neste caso sua estratégia é ridícula. Impedir novos cursos de Medicina gera um revés pesado à qualidade de ensino. Os cursos ficarão protegidos contra a concorrência. Podem cobrar altos preços por ensino de má qualidade. Por outro lado, mais cursos no mercado significa mais concorrência. Para vencer essa concorrência, as principais estratégias ainda são maior qualidade e menor preço.
Dessa forma, surge a dúvida: proibir novos cursos de Medicina é uma estratégia ilegítima ou ridícula? Seja qual for, fica claro que o interesse da portaria do MEC não representa a sociedade. O Brasil precisa de muito mais médicos. Além disso, impedir novos cursos deteriora a qualidade do ensino e da própria prestação de serviço em saúde. O brasileiro precisa respeitar e ter respeitado o direito de aproveitar um mercado livre. É a forma mais competente de gerar benesses e distribuir bem estar.
A redação.
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